Celso Pansera, diretor-presidente do ICTIM/Maricá: Novas fontes para financiar a ciência

Ciência, tecnologia e inovação (CT&I) entraram de forma definitiva na agenda dos governos após a Segunda Guerra Mundial. No Brasil, há um sistema robusto e uma legislação com capacidade de resolver os desafios, como a Lei de Inovação (2004) e o Código Nacional de CT&I (2016). Necessitamos de uma política de Estado com capacidade de reduzir as desigualdades sociais, tornando o país mais justo e solidário, potencializando nossas riquezas naturais de forma sustentável.

Entretanto, a questão do financiamento se configura um grande gargalo. Nos últimos anos, a redução dos fundos quebrou expectativas dos operadores da área, ocasionando incertezas sobre o futuro. Vejamos algumas iniciativas com potencial para constituir recursos para a ciência de forma perene e em volumes inéditos.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) tem sido a principal fonte financeira do setor. A Lei 177/21 obriga o governo a disponibilizar o montante total de seus recursos, algo próximo de 10 bilhões de reais em 2022. No entanto, é necessário estabelecer como regra que o máximo destinado às operações de empréstimos (retornáveis) mantenha-se em 25% desse montante, e os demais 75% sejam consagrados a projetos de fomento, em que se concentra a maior demanda. Importante observar que os valores disponibilizados não podem ser utilizados para substituir obrigações correntes do orçamento do Ministério de Cultura, Tecnologia e Informação.

Já o Fundo Social do Pré-Sal (FSPS) prevê receber aproximadamente 600 bilhões de reais nos próximos 10 anos. Pela regulamentação atual, 37,5% desse valor será empregado na educação e 12,5% na saúde — 50% não possui destinação específica. Tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal projeto de lei destinando 25% dos recursos do FSPS a projetos voltados à CT&I. Sua aprovação poderá acrescentar ao setor um volume próximo a 15 bilhões de reais por ano.

A Lei 13.800/2019 instituiu os fundos patrimoniais aos quais pessoas ou empresas podem aplicar recursos para bancar projetos de diversas áreas, como CT&I, educacionais, assistência social ou esportivos. Para ter uma efetividade real, é necessário alterar a lei, incluindo a possibilidade de incentivos fiscais aos doadores, como ocorre nos Estados Unidos e na Inglaterra.

Outra fonte com potencial para financiamento está nas necessidades do poder público (União, estados e municípios) em adquirir produtos e serviços. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em 2012 as compras públicas englobaram mais de 15% do PIB nacional. Um programa eficiente e bem estruturado de utilização das compras públicas voltadas para a inovação, que utilize 5% destes recursos já gastos pelos entes públicos, significaria destinar 0,6% do PIB para a área. Esta resolução pode configurar uma mudança de paradigma na produção científica nacional, aproximando a academia da iniciativa privada, com grande impacto na economia.

Essas ações dotarão o Sistema Nacional de CT&I da capacidade de financiar e ter retorno, estruturando um ecossistema nacional, estimulando e criando condições de perenidade e ramificação dos recursos para o setor, com foco na estabilização e no desenvolvimento de ações de caráter duradouro em CT&I.

Fonte: Folha de S. Paulo