ARTIGO – Educação a distância: no começo estranha-se, depois, entranha-se!

Ronaldo Mota*

Há 80 anos, em Portugal, o escritor Fernando Pessoa foi convidado a produzir uma peça publicitária para um grande grupo internacional do ramo de refrigerantes, e assim o fez: “Primeiro estranha-se, depois, entranha-se!”. Naquela época, a bebida escura gaseificada estava chegando a Portugal, era desconhecida, de gosto estranho, e precisava de um pouco de poesia para abrir-lhe o caminho.

Hoje, parafraseando o poeta, em contexto sensivelmente distinto do original, permito-me apropriar da ideia do autor para descrever a educação aberta e a distância, que está, cada vez mais, presente em nosso cotidiano. Trata-se de uma modalidade de educação fortemente impulsionada pelas novas tecnologias de informação e comunicação, cujas potencialidades apontam para o atendimento às demandas inéditas da sociedade contemporânea, e em particular no Brasil, país privilegiado com dimensões continentais, nossos atrasos em termos de escolaridade e as desigualdades sociais e econômicas.

Muito além de ser um meio de superar problemas emergenciais ou forma de enfrentar questões de espaços territoriais, educação a distância (EaD) vem, progressivamente, conquistando espaços junto aos diversos sistemas acadêmicos e educacionais, sua oferta combinada aos modelos tradicionais de ensino, em diversos níveis, tem apontado para melhorias.

Por outro lado, no espírito de educação ao longo da vida, a educação a distância tem sido ingrediente fundamental na educação continuada da população adulta. EaD tem forte conexão com democratização de oportunidades educacionais, contribuindo com a formação de profissionais com competências múltiplas. Da mesma forma, estabelece fortes vínculos com democratização de oportunidades educacionais, contribuindo com a formação de profissionais com competências múltiplas, com especial ênfase no trabalho em equipe e na capacidade de aprender a aprender e estimulando o indivíduo a adaptar-se a novas situações.

Assim, a realidade de exigência de formação ao longo da vida propiciara desejáveis conexões entre o campo educacional e o campo do trabalho, que demandarão inéditas ferramentas pedagógicas que, por sua vez, gerarão fortes impactos, tanto sobre os métodos de ensino como sobre a organização dos ambientes de trabalho.

A Lei 5.692, de 1971, que fixava Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, de forma pioneira no país e para atingir maior número de estudantes, se referiu à possibilidade de cursos supletivos utilizarem a modalidade a distância, por meio de rádios, televisão e ensino por correspondência. A nova Lei de Diretrizes e Bases (1996), consolida essa tendência, inovando com a possibilidade de educação a distância em todos os níveis e modalidades de ensino. No ano de 1998, dois Decretos publicados caracterizaram EaD e regulamentam a LDB, definindo competências entre os sistemas federal, estaduais e municipais.

Posteriormente, duas Portarias do MEC (uma de 2001 e outra de 2004) tratam da possibilidade de introdução de métodos não-presenciais na organização curricular e pedagógica dos cursos superiores reconhecidos.

Em um contexto em que a informação estará totalmente acessível, instantaneamente disponibilizada e gratuitamente ofertada, o processo ensino-aprendizagem será profundamente afetado e a incorporação de novas tecnologias e a introdução de metodologias inovadoras serão a marca destes novos tempos. Muito além da simples modalidade, o ensino a distância representa a real possibilidade de conjugarmos quantidade com qualidade e é o prenúncio de um novo período de educação híbrida e flexível, em um mundo globalizado e literalmente sem fronteiras.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, (LDB, Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996) apresentou uma inovação no seu art. 80 estimulando o ensino a distância nos diferentes níveis. A criação da Secretaria de Educação a Distância (Seed/MEC), no início do Governo Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), representou uma iniciativa positiva para a institucionalização da modalidade.

No Governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011), houve um significativo avanço da educação a distância, chegando ao quadro atual em que a educação a distância é a principal responsável pelo crescimento de matrículas no ensino superior.

Educação a distância baseada nas tecnologias digitais rompe fronteiras entre as nações e cumpre o mesmo papel no interior de cada país. Particularmente no Brasil, onde ainda não completamos sequer metade do caminho previsto no Plano Nacional de Educação (PNE) da década passada – “garantir acesso ao ensino superior a 30% dos jovens entre 18 a 24 anos” –, a utilização da modalidade é certamente imprescindível e estratégica para oportunizar que interessados de todas as classes sociais possam ter acesso à educação superior. Além disso, como apontado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), progressivamente, mais de 40% dos ingressantes no ensino superior estão em faixas etárias mais maduras (acima de 24 anos). Esta população demanda metodologias educacionais próprias capazes de permitir que mesmo tardiamente, possa qualificar-se profissionalmente.

Distintamente da educação presencial, na educação a distância a escala não compromete a qualidade, muito pelo contrário. Todos os especialistas internacionais têm segurança em afirmar que a racionalidade e a economicidade envolvidas na modalidade permitem baixar custos e aumentar qualidade simultaneamente. Tal que é mais do que razoável afirmar que na boa educação a distância pode-se obter o dobro da qualidade pela metade dos custos.

Os estímulos para o estudo antes das aulas, a ênfase na existência de portais eletrônicos, aprender a não ter medo de utilizar plataformas, o estímulo à aprendizagem independente e ao ensino baseado em solução de problemas, incluindo metodologias que levem em conta os ambientes do mundo do trabalho, são exemplos de iniciativas que podem ampliar nos educandos habilidades e competências desejadas.

Pessoas educadas são essenciais para a melhoria da qualidade de vida de todos e para o aumento da competitividade e produtividade de um país. A formação de profissionais atualizados é estratégica para as economias competitivas globais. Profissionais com pouca escolaridade desenvolvem de um modo geral  atividades manuais simples, sendo quase impossível a adaptação deles às técnicas e aos processos de produção mais sofisticados. Portanto, a formação de cidadãos aptos a desempenhar tarefas complexas e dispostos a enfrentar os desafios das novas e desconhecidas demandas, por meio do uso intenso e consciente de tecnologias inovadoras, é essencial para a educação contemporânea.

*Ronaldo Mota é Reitor da Universidade Estácio de Sá e Diretor Executivo de Educação a Distância da Estácio

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