O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, convocou audiência pública dia 17/10, para discutir a exigência de chamamento público antes da autorização para funcionamento de novos cursos de Medicina. O Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) entrou como amicus curiae em Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC, no STF, para discutir a ampliação dos cursos de Medicina no Brasil e ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre a Lei do Programa Mais Médicos (Lei 12.871/13).
O CRUB defende a autonomia universitária, a livre concorrência e acredita no discernimento do STF para dar a palavra final sobre a discussão. As medidas foram motivadas depois que a Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP) questionou o STF sobre a abertura de vagas fora do Programa Mais Médicos.
O CRUB ajuizou a ADI 7.187, em contraposição a ADC 81/ANUP. Ambas discutem aspectos que tratam da constitucionalidade ou não do art. 3º, da Lei do Mais Médicos. O CRUB requereu a realização de audiências públicas para que diversos aspectos dessa política pública pudessem ser escutados pelo STF.
Segundo Dyogo Patriota, consultor jurídico do CRUB, a associação defende que a política de editais do Ministério da Educação criou critérios que deliberadamente favorecem grandes grupos econômicos educacionais em prejuízo de associações, fundações e empresas educacionais de médio e pequeno porte. “Esses grandes grupos só defendem a livre concorrência quando são favorecidos. Em outras situações, utilizam subterfúgios para evitar que outras entidades possam disputar mercado com serviços de qualidade”, alerta.
Política de interiorização
Patriota explica que o CRUB levou ao conhecimento do STF diversos elementos que demonstram a fragilidade da política de interiorização de médicos aplicada pelo MEC. Como exemplo, o Edital MEC n.° 6/2014, para interiorização de cursos médicos, focou em diversas cidades próximas da capital ou grandes polos econômicos. Já o Edital MEC n.° 1/2018, foi amplamente dominado pelos grandes grupos educacionais, que obtiveram 25 das 26 autorizações em disputa.
Patriota evidencia que esses grupos foram favorecidos com mudanças nas regras do chamamento público, como inversão de fases de qualificação acadêmica e financeira e a criação de fatores de análise econômica que não estavam previstos nos editais. “Além de afastar qualquer análise de patrimônio líquido, os novos critérios serviram para favorecer as IES constituídas sob a forma de sociedade anônima, focando na ideia de que a capacidade de geração de lucro provaria a boa saúde financeira da IES para todos os fins, o que é proibido pelo Tribunal de Contas da União – TCU”.
Ainda sobre os editais, Patriota explica que critérios de aferição de qualidade deixaram de considerar a existência de campi já instalados na região ou, até mesmo, se as universidades já tinham hospitais próprios. Com a mudança dessa regra, qualquer instituição poderia concorrer, mesmo que não tivesse campus instalado no local. Após ganhar a autorização, essa instituição teria um prazo de quase dois anos para fazer os investimentos e ofertar o curso, na certeza de que o risco de mercado para se interiorizar era quase inexistente.
Posição do ministro Gilmar Mendes
De acordo com o STF, ao convocar a audiência, o ministro Gilmar Mendes destacou a inegável relevância do tema, que envolve não apenas o direito à saúde, mas, também, o objetivo fundamental da República em reduzir as desigualdades sociais e regionais. Na sua avaliação, a coleta de dados e argumentos tecnicamente qualificados e especializados permitirá que o STF examine com maior segurança a imposição do chamamento público e de outros requisitos para a instalação dos novos cursos, com base, ainda, nos princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da isonomia.
O ministro Gilmar Mendes apontou que a reflexão em torno da adequação constitucional da norma requer elucidações administrativas, técnicas e econômicas.
Entre as questões a serem abordadas na audiência estão a [1] oferta e a distribuição de médicos no Brasil, [2] os recursos essenciais para o funcionamento adequado dos cursos, [3] o impacto do chamamento público na distribuição regional de médicos e na formação médica e a [4] dinâmica do mercado de cursos de Medicina.
Saiba mais
O chamamento público é um procedimento feito pela administração pública para selecionar parcerias para executar atividades ou projetos que tenham interesse público. No caso dos cursos de Medicina, ele está previsto no Programa Mais Médicos (Lei 12.871/2013, artigo 3º), sob a responsabilidade do Ministério da Educação.