Diante da crise de saúde pública causada pela contaminação de bebidas com metanol no Brasil nas últimas semanas, pesquisadores da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) redirecionaram seus estudos para auxiliar na detecção desse contaminante. O método é rápido, sustentável e ambientalmente seguro. A precisão é de 100%, mesmo quando a concentração de metanol é baixa.
Os cientistas testaram 323 amostras das bebidas destiladas uísque, vodca e gim, puras e com metanol adicionado por eles, em concentrações que variaram até 4%. Essas amostras foram colocadas diretamente no cristal do sensor fotônico (chamado ATR-FTIR) e escaneadas por meio de raios infravermelhos, em um processo que leva cerca de um minuto e não necessita de reagentes.
Nesse escaneamento, parte da luz é absorvida e outra parte refletida pelos espelhos detectores do sensor. O resultado gera um espectro, uma espécie de “assinatura” de cada componente. O metanol demonstrou um pico vibracional em uma região específica do espectro (entre 1.000 e 1.030).

Para fazer a detecção precisa do metanol, mesmo em concentrações baixas, os dados do sensor fotônico foram enviados para uma inteligência artificial (IA) não linear, capaz de capturar e processar dados complexos, chamada Máquina de Vetores de Suporte (em inglês, Support Vector Machine – SVM), treinada pela UFU para essa finalidade. Em concentrações de 0,25% de metanol, a diferença no espectro é sutil, mas o algoritmo de IA não linear conseguiu detectá-la com 100% de acerto em vodka e uísque e 98,9% em gim, em menos de um minuto.
A pesquisa foi desenvolvida pelos professores Robinson Sabino da Silva, do Instituto de Ciências Biomédicas (Icbim/UFU), e Murillo Guimarães Carneiro, da Faculdade de Computação (Facom/UFU), e pela doutoranda paquistanesa Faryal Khan, do Programa de Pós-Graduação em Imunologia e Parasitologia Aplicadas (PPGIPA/UFU). Também contribuíram os pesquisadores Jardel Reuel Rangel, do Programa de Pós-Graduação em Odontologia (PPGO/UFU); Mário Machado Martins, do Instituto de Química (IQ/UFU); Thulio Marquez Cunha, da Faculdade de Medicina (Famed/UFU); Dnieber Chagas de Assis, da Escola Técnica de Saúde (Estes/UFU); e Paulo Diego da Silva Souza, do Programa de Pós-Graduação em Computação (PPGCO/UFU).
O financiamento é dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Nesta sexta-feira (10/10), a Agência Intelecto, vinculada à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propp/UFU), depositou o pedido de patente da tecnologia desenvolvida pela UFU junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).
Robinson Sabino e Faryal Khan fazem as análises no sensor; Murillo Carneiro processa os dados por meio de IA (Foto: Marco Cavalcanti)
A invenção representa um avanço para uma contribuição da universidade para problemas na sociedade, afirma Sabino-Silva. “Nosso objetivo é criar tecnologias acessíveis que permitam detectar adulterações de metanol em bebidas destiladas de forma rápida e sustentável, protegendo vidas e fortalecendo a indústria brasileira”, completa.
Os cientistas da UFU estão disponíveis para auxiliar empresas e bares que queiram fazer o serviço de testagem e criar, por exemplo, um selo de qualidade para suas bebidas. Os pesquisadores consideram ainda criar um projeto de extensão para oferecer o serviço de testagem à população.
O processo é rápido, pois cada uma das duas etapas leva cerca de um minuto, além de sustentável e ambientalmente seguro, pois não necessita de reagentes químicos. Com 20 centímetros de largura e 30 centímetros de comprimento, o sensor fotônico é considerado portátil, em comparação com outros equipamentos, e custa cerca de R$ 150 mil reais.
Na quarta-feira (8/10), o Ministério da Saúde informou que foram registradas 259 notificações de intoxicação por metanol, sendo 24 casos confirmados e 235 em investigação. Outras 145 suspeitas foram descartadas.