ARTIGO – O papel da Universidade no ecossistema de inovação

*Benedito Guimarães Aguiar Neto

É inquestionável, a importância estratégica que assume cada vez mais o domínio do conhecimento científico e tecnológico para o desenvolvimento sustentável de qualquer país.

Afinal, a competitividade de um país no mercado internacional esta intimamente ligada à sua capacidade de inovar e, dentre outros fatores, à estrutura do seu sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação.

Nesse contexto, a pesquisa exerce um papel fundamental no desenvolvimento da inovação e, portanto, a universidade, como principal ambiente de geração e difusão do conhecimento.

Não significa que a universidade deva se voltar totalmente ou unicamente para o exercício da inovação; certamente deve exercer a sua missão precípua de formação de pessoas altamente qualificadas, bem como de transferência de conhecimento à sociedade, que não necessariamente importa em inovação.

Mas, sem pesquisa não há inovação, e sem inovação não há produção de novas tecnologias para a melhoria da competitividade de produtos, processos e serviços de base científica e tecnológica.

A pesquisa é estratégica em qualquer ecossistema de inovação, em qualquer área do conhecimento, pois é um insumo fundamental para o desenvolvimento do empreendedorismo, que utilizará dos seus resultados em termos de processos, métodos ou técnicas oriundos de invenções ou aperfeiçoamentos.

Contudo, não são raros os casos de invenções, como fruto da pesquisa,que apresentam grande potencial de inovação, mas que não se configuram como tal, pois falta a percepção da sua aplicabilidade e, consequentemente, de interesse do mercado. Acabam sendo consideradas apenas pesquisa de perfil inovador, e não geram patentes que representam o elo formal da inovação.

A Inovação tecnológica, conforme a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) “é toda novidade implantada pelo setor produtivo, por meio da pesquisa e investimentos, que aumenta a eficiência do processo produtivo ou que implica um novo ou aprimorado produto”.

Assim, não pode haver separação da inovação do empreendedorismo, pela inerente relação com o mercado.

Falta, portanto, em muitas das situações de geração do conhecimento na universidade, a real percepção do conceito de inovação quanto à relação com a variável mercado. Na academia, há uma preocupação primordial com relação a geração do conhecimento, e isso é indispensável. Contudo, em algumas áreas do conhecimento, a exemplo das engenharias e outras áreas tecnológicas não é admissível que esse conhecimento gerado fique restrito ao âmbito acadêmico. É o chamado conhecimento científico de prateleira a espera do usuário.

Quando se trata de transformar o conhecimento em inovação, o sentido está completamente invertido. Primeiro há de haver a ideia da aplicação, e isso é papel do mercado, representado pelos mais diversos setores da sociedade sendo a empresa, pública ou privada, a responsável. A universidade deve ser, nesse contexto, parceira para que ciclo da inovação possa ser levado a efeito a contento.

Assim, é imprescindível o papel do mundo empresarial na parceria com a universidade para o desenvolvimento da inovação tecnológica. E dessa forma, considerando-se o próprio conceito e o contexto apresentados, a inovação não é tarefa precípua da universidade, mas do setor empresarial. Todavia, se torna mais eficaz quando realizada em conjunta com a academia. O setor empresarial, seu principal responsável, não pode, por outro lado levar a efeito o seu intento sem que se aproprie do conhecimento científico gerado, que o papel primordial da universidade. Configura-se, portanto, um desafio conjunto e um processo interativo.

Nosso grande desafio é promover a integração universidade-empresa no processo de apropriação do conhecimento científico, pois se não houver aplicação, não houve a demanda, ou seja, não há interesse empresarial e, consequentemente, qualquer inovação.

Há de se quebrar a barreira que dificulta a interação universidade-empresa, para a constituição de redes de parcerias colaborativas e de sistemas de inovação. Mais do que nunca, em razão da diversidade de saberes e interesses há uma necessidade de complementaridade de atuação dos atores envolvidos no desafio da inovação.

Há de se considerar nesse sistema, comumente denominado “tríplice hélice: academia, empresa e governo”,o importante apoio das agências de fomento governamentais, mas que restringe-se, em geral, ao financiamento da pesquisa básica. Nesse modelo, tem havido, ao longo dos anos, uma expectativa excessiva com relação à participação do financiamento público do ciclo da inovação.

Assim, o modelo “tríplice hélice”, vigente durante muito tempo no país, precisa ser repensado, pois não dá conta do financiamento do ciclo completo do processo de inovação, havendo uma certa subordinação dos atores envolvidos ao estado.

Além disso, os entraves burocráticos, característicos desse modelo, impactam negativamente a dinâmica do empreendedorismo que exige respostas rápidas diante das demandas postas. Soma-se a isso, as restrições orçamentárias, sobretudo nos dias atuais, que levaram a uma redução significativa de recursos destinados à P&D, dificultando ainda mais o seu financiamento, mesmo da pesquisa básica, que deve ser papel do estado.

Uma política de P&D mais eficaz precisa ser urgentemente alcançada, que proporcione o pleno e adequado funcionamento da engrenagem “tríplice hélice”, e que possa ter reflexos na economia para melhoria da competitividade do país. Educação, apoio ao desenvolvimento da ciência básica e política eficaz de P&D não podem estar dissociados quando se objetiva desenvolver uma indústria competitiva.

Portanto, a inovação, no seu ciclo de desenvolvimento, exige financiamento da própria empresa parceira para que os resultados sejam frutíferos.

Tem sido notável o desenvolvimento científico nas universidades do nosso país, tanto no aspecto quantitativo quanto qualitativo, traduzidos pela posição invejável no cenário internacional, no qual figuramos no décimo terceiro lugar no ranking de produção científica mundial. Esse papel outrora reservado às Universidades públicas tem mudado substancialmente com a importante expansão dos setor privado no país, notadamente entre as Universidades Confessionais e Comunitárias que tem investido em pesquisa, a exemplo das Universidades Católicas e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, esta última destaque este ano com um grande empreendimento, denominado Centro de Pesquisas Avançadas em Grafeno Nanomateriais e Nanotecnologia – MackGraphe, voltado para o desenvolvimento de pesquisas aplicadas com foco na inovação, em parceria com o setor industrial.

O ecossistema de inovação, portanto, não pode prescindir de uma participação mais efetiva do setor empresarial. Por outro lado, embora a universidade brasileira venha tentando cumprir a sua parte, precisa ainda mais avançar em estruturas adequadas à pesquisa, se considerarmos todo o conjunto de instituições do país, e empreender um esforço ainda maior de aproximação com os setores industrial e de serviços, com a criação de estruturas internas de incentivo à pesquisa aplicada, transferência de tecnologia e ao empreendedorismo.

A exemplo da Coréia, cujas universidades e empresas já venceram esses desafios, o Brasil precisa avançar ainda muito nesse objetivo, através do fortalecimento do seu ecossistema de inovação, com uma política competente de P&D.

Nesse sentido há de considerar, a criação de incentivos à livre iniciativa e mudanças de paradigmas que proporcionem mais liberdade econômica às empresas, um aspecto crucial para que a indústria nacional se aproxime mais da universidade, e em consequência disso, crie melhores perspectivas de transformar a ciência em negócio para o desenvolvimento social e econômico do país, por meio de maior competitividade da indústria brasileira.

Assim, para que o nosso país possa sair do atraso em que se encontra em termos de competitividade internacional, é imprescindível que a engrenagem funcione adequadamente, com todos os seus atores conscientes dos seus respectivos papéis.

*Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) e Reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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