ARTIGO – Educação: quando tudo ainda é pouco

Por: Ronaldo Mota*

Educação tem uma propriedade quase única no rol de produtos ou serviços em geral. Alimentos, por exemplo, quando ingeridos em excesso podem fazer mal. Automóveis, a partir de uma certa concentração, geram engarrafamento e poluição. Dinheiro, em qualquer moeda, aumenta seu valor à medida que falte aos demais, atendendo ao pressuposto da valorização pela exclusividade ou baixa disponibilidade.

Educação segue a lógica contrária. Quando alguém é educado, individualmente a pessoa ganha, mas a comunidade à qual ela pertence é mais favorecida ainda. Ao sermos educados, um não tira do outro quando aprende ou ensina. Por outro lado, é certo que todos são prejudicados pela ausência de educação ou pelo ensino de má qualidade.

Além disso, não há nenhum antídoto melhor contra a violência do que pessoas educadas. Polidez gera gentileza, bem como agressividade promove brutalidade. Da mesma forma, a falta de emprego decorre, na maioria dos casos, da falta de escolaridade, evidenciada pelo fato de que o desemprego mais crônico está associado a lacunas nas competências e habilidades demandadas.

Mesmo sendo uma nação privilegiada em recursos naturais, o Brasil não consegue promover um desenvolvimento sustentável. Cresce, mas alterna ciclos de euforias com frustrações. Provavelmente, a mais relevante causa da não sustentabilidade do desenvolvimento é a baixa produtividade em geral. Há evidências de que o aumento da educação média da população traz reflexos imediatos para a qualidade de vida, gerando oportunidades de empregos e de negócios, e, consequentemente, maior competitividade global dos produtos e dos serviços de uma região.

Na área educacional, tudo que tem sido feito, na prática, é ainda muito pouco. Ressalte-se que tivemos avanços, ainda que insuficientes, tais como o aumento da percentagem do PIB na educação pública de 2,9% para 5,6% em uma geração, redução de 35% para 7% de crianças de 4 a 14 anos fora de escola e o analfabetismo adulto decresceu de 25% para 8% nesse período. No ensino superior, programas como PROUNI e FIES têm viabilizado que milhões tenham acesso às universidades. Mesmo assim, em que pesem esses resultados, educacionalmente, estamos muito aquém de outros países com os quais teria algum significado compararmos.

Há que, urgentemente, estabelecermos novas estratégias com focos mais claros, cujos impactos resultantes sejam, ao longo do tempo, mais efetivos. Uma proposta, de caráter complementar e não excludente de outras, seria estabelecer um ponto de corte etário, baseado em uma política pública de atenção diferenciada aos mais jovens, e que, progressivamente, atinja a todos os educandos em um futuro adiante.

O Art. 81 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/1996) estimula a organização de cursos ou instituições de ensino experimentais. Dentro desse espírito, seria possível estabelecer um abrangente programa experimental, articulado entre todos os sistemas educacionais, via a adoção de práticas amparadas em flexibilidades e prerrogativas especiais. A título de exemplo, no primeiro ano de sua implantação, seria conferida atenção diferenciada somente à primeira série do ensino fundamental. Como orientação aos gestores escolares, os melhores professores e infraestruturas disponíveis seriam garantidos para esta série e recursos adicionais extraordinários seriam, especialmente, dirigidos a essas turmas.

Entre outras diversas ações, em função de uma convocação cívica nacional, atividades complementares no contraturno seriam desenvolvidas por profissionais voluntários com nível superior. Estes seriam selecionados e ficariam responsáveis por ações definidas pelas direções locais das escolas, em consonância com orientações gerais do programa. Ilustrando, um dentista voluntário poderia abordar, complementarmente, elementos de saúde e biologia, um engenheiro contribuições adicionais na matemática, artistas abordariam temas nas áreas de cultura e artes etc.

No ano seguinte, manter-se-ia o foco nas turmas inicialmente selecionadas, já agora na segunda série, e seriam incorporadas, com a mesma qualidade, as novas turmas do primeiro ano. Ao final de menos de uma década, teríamos formado uma nova geração educacional, agora frequentando o ensino médio, incluindo o profissionalizante. Ao se completar uma década e meia, estaríamos colhendo os devidos frutos no nível superior.

O único real privilégio destas novas gerações, diferenciadamente educadas, será carregar nos ombros o compromisso de colaborar para um desenvolvimento econômico, social e ambiental sustentável.

*Chanceler da Estácio

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